Espiritualidades no timing da vida: Duas Saudades de setembro

                                                              Jaci Rocha Gonçalves*

Anjezë Gonxhe Bojaxhiu/Santa Teresa de Calcutá


A primeira saudade é de 4 de setembro de 2016. A canonização de Anjezë Gonxhe Bojaxhiu como Santa Teresa de Calcutá. Canonizar é confirmar que aquela micro mulher vestida com sári branco e duas listras azuis, roupa dos intocáveis da Índia é mais  intercessora junto de Deus, espécie de nossa advogada celestial e exemplo de vivência do amor à maneira de Jesus Cristo de acordo com a Igreja Católica.

Desde jovem padre, meditava seus pensamentos e me inspirava em suas práticas. Essa admiração pela mulher miúda e franzina acontecia em lugares e por pessoas as mais inesperadas como pelos comunistas na cidade de Moscou quando lhe permitiram ter uma capela com o Santíssimo Sacramento no Hospital de Moscou. Suas obras de amor aos sofredores derrubaram fronteiras ideológico-religiosas e político-culturais como na Índia no caso da cidadania dos Intocáveis.

Murad Ahamad Khan, no 1º Congresso 
Internacional Revitalizando Culturas
Quem me clareou essa visão foi a outra presença saudosa deste setembro do doutor indiano Murad Ahmad Khan, um dos convidados de nosso 1º Congresso Internacional Revitalizando Culturas sobre Indigenismo realizado de forma emocionante de 13 a 15/9/2016 no campus da UNISUL Pedra Branca e no Centro Cultural Tataendy Rupá na aldeia indígena Itaty do Morro dos Cavalos aqui em Palhoça (SC), sob o indispensável apoio do PAEP/CAPES.

Em entrevista à TV UNISUL, ele explicava que Madre Tereza de Calcutá passou a ser um símbolo nacional de cuidado com a vida de todos. Sua presença solidária tem sido memória determinante para que o dalit, o Intocável, o cidadão sem casta, possa ter sua cidadania garantida como alguém que conta na sociedade. E dizia ainda que essa forma de olhar e reconhecer a dignidade humana do outro tem feito do cristianismo na Índia o caminho de ascensão social para os dalit mais que em qualquer outra das grandes espiritualidades da Índia como o Budismo e Hinduísmo. Murad é de espiritualidade muçulmana.

Mahatma Gandhi
Ambas as saudades de setembro me remeteram ao estadista indiano que mais li  ao longo da vida: o Mahatma Gandhi cujo método da não-violência ativa me inspira até hoje. Quando a Madre Teresa morreu 1997, de ataque do coração e malária, seu corpo foi transladado ao Estádio Netaji para a missa no mesmo veículo que, em 1948, transportara o corpo do Mahatma Gandhi. Por coincidência foi no mesmo ano que a "Mãe dos pobres" cursa enfermagem, recebe a nacionalidade indiana e vai dar aulas para cinco crianças que dez dias depois já são cinquenta. É seguida por  Shubashini uma de suas antigas alunas, filha de uma rica família, disposta a colocar sua vida ao serviço dos pobres. Hoje são milhares de mulheres e se apelidam como "Missionárias da Caridade".

Tenho insistido nessa coluna sobre a força ética da biocracia, ou seja, aquela espiritualidade que se deixa governar pelo valor da vida, de todas as vidas para além dos ditames do mercado. Prova dessa importância junto ao que Murad nos lembrava acima podemos lembrar que a santa recebera o Prêmio Nobel da Paz, em outubro de 1979, muitas universidades lhe conferiram o título "Honoris Causa"; em 1980, recebe a ordem "Distinguished Public Service Award" e a Medalha Presidencial da Liberdade nos EUA e  a Medalha de ouro do Comitê Soviético da Paz.

Eu me sinto condecorado por essas duas saudades de setembro: o doutor Murad me vestiu com o Sadri, jaleco que lembra Grandhi e seus ideais de não-violência ativa. Madre Tereza no encontro inesperado dessa foto em Roma, um ano antes de sua morte, pôs suas mãos em minha cabeça de padre reoptando por formar uma família e me diz: “Não tenha medo, padre, Deus te abençoa!” São saudades que nos refazem. Vamu que vamu!






*Padre Casado, Doutor em Teologia, Filósofo, estudou
Comunicação no Vaticano e é Professor da Unisul.


Publicado Originalmente Jornal Cotidiano
em 30 de Setembro de 2016.


Comentários

  1. Reler esta crônica em 14 de setembro de 2021, é como retomar energias de sonhos sonhados por tod@s. Sonhos JÁ iniciados e AINDA NÃO concluídos! Iniciei hoje um mergulho no passado recente em vista da busca de novas atividades nos próximos 30 anos. Aweté! Axé! Shalom! Namastê! Amém!

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