A cachoeira jorrando água, o milharal sagrado pendoando, cheiro de Petanguá por todo o lado da aldeia Tekoá Marangatu, ontem, sexta-feira, 17 de dezembro de 2010.
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Tekoá Marangatu é uma das 14 aldeias mbyá-guarani do litoral catarinense. |
No salão da aldeia todo enfeitado com um enorme telão, o velho karaí Mário, o cacique Gerônimo, muitas crianças e jovens faziam um silêncio sereno.
Eu disse: - Gostaria de oferecer uma surpresa aos meus afilhados! - O senhor fale com o cerimonial lá na sala de aula, respondeu Simone. Mais tarde eu soube que era filho do professor Luís Gonzaga dos mais conhecidos docentes lutadores pela justiça e dignidade humana da região. Acompamho sua luta há 30 anos. Agora é formando em Letras da Unisul PB.
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Eduardo, guerreiro da vida guarani, passou no vestibular de Licenciatura Indígena. |
Na sala, manipulando um leptop, Eduardo, filho do meu velho amigo Augusto Karaí Tataendy, selecionava um menu de músicas dos corais guarani para a festa. Eduardo é Nhemboá (professor guarani) e está vibrando sob um cocar merecido de jovem guerreiro de sua comunidade.
São quatro
ava (homens)
e quatro
kunhá (mulheres) que se formam. O número quatro resume bem os elementos vitais da terra, como pensa o povo guarani - os quatro ventos, as quatro luas, a direções e o ar, a terra, fogo e água. Sabedoria descrita no
adjaká (cesto colorido) que dona Ana, esposa do xamã, me presenteou. O imponente cesto se estrutura em quatro pontas cujo entrelaçar termina num círculo solar. De fato, o sol (kuaray, kuarany, guarany) é a força máxima para o nascer e o manter a vida.
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Guerreiros/as guarani da Tekoá Marangatu com alguns convidados |
Os discursos dos professores e do prefeito de Imaruí, me comoveram por dois argumentos repisados: o quanto de preconceito enfrentaram até aqui e a decisão de continuar a luta com fôlego suficiente. Floriano falou em nome dos formandos: primeiro em guarani, olhando para seu povo; depois leu algumas frases em português, bem pausadas e humoradas. "Agradecemos as professoras porque nos ensinavam com alegria. Foi muito divertido estudar. Não foi uma coisa chata!" Ficou também um compromisso: a luta pela continuidade com a criação do ensino médio e pela chegada da internet.
Dividi minha fala em três presentes: uma coleção de postais culturais cada um feitos quando os formandos eram crianças e adolescentes há 12 anos no Morro dos Cavalos - trabalho do Unisul Revitalizando Culturas e a AIMG - Associação Indígena Mbyá-Guarani; uma bola de futebol multicor, fortalecendo a alegria comunitária e a música
Indio do Uruguai para que os
Djuruá (não-índios) continuassem alunos dos guarani. Lembrei que o autor, o humorista Arnaud Rodrigues, falecera este ano no Rio Araguaia.
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Xamã do coral faz a reza do colar protetor para o prof. Jaci. |
Mas quando reparei que o nome da turma era Sepé Tiaraju, pedi que cantessem comigo aquela parte da canção deste herói guarani: "Mais um valente guerreiro a morrer pelo seu povo; é por isso que seu nome pro nosso povo é sagrado; São Sepé subiu pro céu, sua cruz ficou no azul, cai a noite ela rebrilha, ele é o Cruzeiro do Sul. Sepé Tiaraju!"
Depois, andei pela aldeia, brinquei como tatu e recebi a bênção do xamã, que reparto com todos vocês!
E a luta pela dupla cidadania deste povo prossegue...
Parabéns pelo trabalho!
ResponderExcluirFoi muito importante esse dia na Tekoá Marangatu. São etapas que vão sendo vencidas, são conquistas, é história. Sua participação foi fundamental. Obrigada pelo seu trabalho. Um abraço,
ResponderExcluirRevendo hj em março de 2020. Eduardo, seu pai Augusto foram para a Terra Sem Males. A Aldeia Marangatu é hj um exemplo de Tekoá que acolhe até o guarani que errou ou se sente em dificuldade; refaz o ethos de cada guarani cultivando a mística e sacralidade do espaço e a ligação com a grande floresta da Serra do Tabuleiro. A escola tem preparado para a Universidade e para as organizações nacionais e internacionais de povos originários, sustentando o fôlego nas suas lutas.
ResponderExcluirRevendo esta matéria em 2021 durante a luta contra o PL490 que inclui o Marco Temporal, refaço o meu fôlego sentindo a força de todos os que já foram para Nhanderu Tupã na YVY MARA-E (Terra Sem Males). Aweté!
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